Uso muitas vezes o blogue como uma espécie catarse para os meus pensamentos, e foi o que fiz com um post que coloquei há dias. Mal eu sabia que tudo o que o meu pai manifestava iria culminar com um internamento forçado num serviço de neurologia.
Ver o seu olhar de confusão a pedir-me que o desamarre, já que é incomportável que ele não esteja preso, para sua segurança e dos demais, é verdadeiramente torturante.
Mas nestas lides pelo Hospital, um Hospital que raramente usei como utente, permitiu-me perceber alguns pequenos detalhes. Acho que todos os profissionais deveriam passar para o lado de lá de vez enquando para se empatizarem com o outro.
Para quem não percebeu ainda sou uma profissional de saúde, uma enfermeira. Embora a minha área atualmente seja um pouco diferente do que a maioria está habituada, seja como for, sei o que é estar nessa profissão. Felizmente a minha escola tinha uma máxima exigida a todos os alunos “Saber estar”. E essa máxima era levada tão sério que um colega meu, aluno de 19 na teórica, chumbou em estágio porque a sua postura era demasiado relaxada e um pouco “baril” ou “cool” para os olhares dos avaliadores. De facto assim era. E aquilo que na altura, como aluna, achei um exagero compreendo-o agora muito bem. Esse aluno foi obrigado a esperar por outro grupo de alunos que entrasse em estágio para prosseguir de ano, custou, mas a sua postura como futuro enfermeiro mudou radicalmente.
Além desse “saber estar” insistiam muito que tivéssemos empatia com o utente. Que compreendêssemos o que era estar do lado de lá. Claro que isto é muito lindo na teoria mas nem todos o conseguem na prática, até porque muitas vezes se esquecem do que representa esta profissão. Não é um mero emprego, representa o “cuidar”. Algo que deve ser levado além do dinheiro que necessitamos no fim do mês na conta bancária.
Isto to para dizer que encontrei alguns profissionais, e ainda jovens, como um ar enfastiado sempre que lhe dirija uma pergunta ou pedia ajuda para algo.
Ah! Convém saber que não tenho por hábito identificar-me como coleja de profissão, só o faço em última instância. E sim, a o trato seria diferente, já me aconteceu depois de dizer que sou enfermeira a atitude mudar radicalmente, isto quer para colegas meus quer para médicos.
Mas também devo dizer que tenho encontrado profissionais extraordinários. E neste serviço onde o meu pai está a equipa é excelente. Mesmo sendo poucos profissionais para a carga de trabalho nota-se uma certa serenidade por parte deles. E Encontrar quem tenha a capacidade de saber cuidar é um alento para quem está fragilizado.
Estar numa sala de espera a aguardar consulta médica é sempre tema para um post. Primeiro, porque se encontra de tudo, o menino que não está quieto, o leitor(a) de um livro de qualidade, o leitor de jornal que leva com ele o Jornal de Notícias, a Bola, o Record e, no pior dos casos, o Correio da Manhã. Nesta qualidade de leitor de jornais temos duas espécies, o que lê e se cala e o que lê e a seguir comenta para o lado qualquer notícia, estejas ou não interessado! Existe também a jeitosa, a pintadinha, a idosa simpática, as pessoas que colecionam doenças e se rivalizam com as mesmas e, claro, a bloguer que realiza anotações mentais para um futuro post.
Claro que para quem está 3 LONGAS e miseráveis HORAS à espera de uma consulta, presumivelmente, marcada para as 9:00 da manhã há sempre tempo para observar até as ínfimas frechas da parede do Hospital!
A primeira hora ainda desculpamos o atraso, afinal imprevistos surgem, principalmente quando existe doentes a precisar de falar. Mas 3 horas é muito imprevisto! Ou má organização. No caso, é mesmo má organização. Passada a primeira hora e meia, de rabo e costas doridas da cadeira, a menina aqui levanta-se para perguntar se na secretaria farão alguma ideia de quanto tempo demorará mais o doutor a chamar, não, não sabem... o Sr.Dr. chama por ordem de chegada, respondem. "Colocamos lá os processos e depois ele chama por isso, não fazemos ideia de qual é o andamento, apenas sabemos que demora". Ok... lá vai a menina sentar-se e verificar mentalmente, já que nas salas de espera se usa muito a parte mental, quem é que chegou antes e depois dela. Como estão ali doentes para outros médicos a tarefa não é fácil, mas assim que a sala começa a esvaziar já começamos a ter uma noção.
Passam 2 horas e um quarto, e depois de ter sentado, levantado, ido ao WC duas vezes, ter andado pelos corredores e ter mudado de lugar porque o antigo foi ocupado, vejo que chama uma pessoa que tinha chegado depois de mim, deixei passar, se calhar não vi bem. Mas, entretanto, chama uma idosa que tenho a certeza que chegou depois. Levanto-me e vou outra vez à secretaria, desta vez está uma funcionária que conheço. Pergunto, "Afinal é por ordem de chegada ou pela ordem do Doutor?", como ela me conhece já consegue ver no computador quem está à minha frente e, de facto, as duas pessoas que chamou tinham chegado depois. Peço o livro amarelo, resposta da funcionária "Não faças isso porque senão é que ele nunca mais te atende!", levanta-se e vai falar com o médico, ao regressar trás uma explicação com lógica "O doutor chamou aquela senhora idosa antes porque já a conhece e sabe que ela não pode esperar muito e tu tens mais uma pessoa à frente e és a seguir."
Agora o que não tem lógica nenhuma é, a idosa, que não pode esperar muito, esperar ali 2 horas!! Quando se tivesse hora marcada, e o sistema de hora marcada fosse mais ou menos seguido, claro que com os tais atrasos imprevistos, não teria certamente esperado tanto. Nem ela e nem eu! O sistema ali é assim: Marcam tudo para a mesma hora e depois é consoante a ordem de chegada e a ordem do Doutor. Irra!!! Será complicado marcar uma hora e nem nós esperamos tanto nem as salas ficam tão cheias a abarrotar?
Há alturas em que me parece que há profissionais que gostam de ver o circo pegar fogo!!!
Esta é a segunda fase dos meus relatos das experiências passadas com meus pais. Deixei este para último porque é o mais difícil de escrever e o mais difícil de recordar, já que não é só uma recordação mas algo que ainda sobrevive ao dia-a-dia.
Em agosto de 2012, e depois de muitas peripécias que qualquer dia contarei, foi diagnosticado ao meu pai, nos Hospitais de Coimbra, uma Demência de Corpos de Lewy, que qualquer pesquisa simples na net vos elucidará do que se trata. Menos frequente que o Alzheimer e com progressão mais rápida e igualmente difícil, quer para o portador da doença quer para os seus familiares. E chega a um ponto que sobretudo para os seus familiares.
Podem dizer-me "Faço ideia do que estás a passar". Eu respondo a esta frase, não. Não fazem a mínima ideia do que é ver o nosso pai (neste caso) ser portador de uma demência. Do que é vê-lo a não ser ele, do que é vê-lo a ir-se e o seu corpo ainda estar presente. Dói mais do que a morte. Porque é uma morte lenta e insidiosa. Leva-o todos os dias. Tira cada dia um pouco e cada dia o leva para mais longe. Não é ele que está ali...
Alguém me dizia aqui há uns tempos. Não digas isso, ainda o podes abraçar. É verdade. Ainda o posso abraçar, ainda tolera os abraços que nunca me deu e agora dá, porque agora não tem o travão mental de não demonstrar carinho. Ainda tolera abraços porque ainda me conhece, ainda não está agressivo. Mas que preço tem este abraço? Um preço que não vale a pena pagar... Estarei a ser crua ou realista de mais? Vejo as coisas de dentro e não de fora. Tão simples quanto isso.
Este tipo de Demência está associada a sintomas Parkinsónicos. Ambas as doenças são de cariz neurológico e associadas a geriatria mas como exibem alterações de comportamento levam a um internamento na psiquiatria. Se tem ou não lógica não sei. O certo é que o serviço de neurologia não está preparado para receber estes doentes e não existe outro serviço adequado para pessoas que necessitam de uma vigilância constante, quer pelo seu sentido de orientação alterado, quer pela sua parte cognitiva já com muitas falhas. E é deste serviço, da psiquiatria de um Hospital em Trás-os-Montes, um grande Hospital considerado de "qualidade", onde o meu pai esteve internado que vou falar o que muitos calam. Calam por vergonha de dizer que estiveram lá internados, por vergonha de ter tido um familiar lá internado, por pruridos de uma sociedade hipócrita e mesquinha.
Ao entrar naquele serviço parece que recuamos no tempo. Depois de questionar algumas pessoas, nomeadamente profissionais de saúde que trabalham em outros locais e nesta área, pude constatar que felizmente não é frequente a existência de locais que funcionam como aquele serviço em particular, género psiquiatria de há um século atrás. Ali as mulheres e homens estão no mesmo espaço físico, à noite estão em dormitórios separados mas de dia não. Outra particularidade é que os doentes durante o dia não têm acesso à sua enfermaria, o que dificulta o acesso aos seus pertences, como roupa e produtos de higiene. Ali não se lava os dentes a menos que se ande com a escova e pasta à tiracolo. Não se tem roupa própria, porque nem sei se existe onde a guardar, já que não vi as enfermarias, e me disseram para não levar a roupa dele. Disseram que tinham pijamas no serviço e fatos de treino e tudo o que fosse preciso. Ok...
O que se vislumbra são pijamas a cair pelas pernas abaixo dos utentes, e se há os que conseguem ir puxando a roupa atempadamente, há os que, por força da lentidão produzida pela medicação não o conseguem fazer, portanto estão a ver o aspecto que dá pessoas com as calças a cair e com ar de que não estão bem neste mundo?
Além disso, todas as patologias também estão juntas, é tudo ao molhe e fé em Deus. Quem é internado por uma depressão sai dali mais deprimido, isso é certo. Terapeuticamente controlado, mas mais deprimido. Como não se podem deitar, porque as enfermarias estão fechadas se bem se lembram, e a medicação dá pedrada vemos pessoas deitadas pelos cadeirões num desconforto que dá dó. O ar andrajoso que transmitem é gritante. Cheguei a ver um senhor no chão do corredor a bater com a cabeça na parede e ali esteve um bom bocado.
A única casa de banho que serve todos os utentes tem o papel higiénico fora da proteção, exigida num estabelecimento público, que estava ausente e pelo que constatei há muito partida. A figura em que estava o papel higiénico, que andava nas mãos de todos, estava indescritível! O aspecto físico degradante do serviço era notório! E era notório que era um serviço esquecido há muito pela administração do Hospital que sabe que doentes psiquiátricos não se queixam e se o fazem ninguém lhes dá crédito. Triste, mas a pura realidade. E triste que a própria sociedade também parece forçar a esse esquecimento. Pois bem, ninguém está livre, isso assusta não é? Não fujam porque o que têm medo ainda vos pega!
Num dos dias quem que visitei meu pai ele estava vestido com um roupão que tenho a sensação que nem o meu cão se deitaria ali! Aliás, tenho a sensação quem nem um cão de rua se aproximaria daquilo! Se o roupão lhe tirou o frio e providenciou o conforto necessário? Acho que sim. Mas e a dignidade humana? Mesmo sujeita a perder um roupão vesti-o com outra coisa que não aquilo! Soube depois que outros doentes se encarregavam de ajudar o meu pai a não perder o acessório.
E agora o que mais me custou. Estive uns dias sem realizar a visita. Habito longe e tive que trabalhar. Quando fui lá constatei o que a minha prima me dizia pelo telefone. O seu estado era deplorável! Ele necessita de ajuda para realizar as actividades mais básicas como o cuidar da sua higiene. Fá-lo, mas precisa de ajuda. Precisa de ajuda até para lavar a cara e escovar os dentes. Que se lhe diga "agora lave a cara", e ele lava. "Agora escove os dentes". Embora tenhamos que colocar a pasta e dizer quando bochechar e cuspir fora. A cara dele não era lavada há séculos!!! Estava cheia de crostas, unhas sujas, dentes cheios de comida,... a descrição pode estar a ser nojenta, mas foi com esse aspecto mal cuidado que o encontrei!
No dia da alta para o vestir mandaram-nos para a tal casa de banho usada por todos os utentes (foi aí que eu vi o estado da coisa) para vestir um senhor de idade, com dificuldades motoras, que não tinha onde se sentar para se vestir e que tinha dificuldade em estar de pé. E nem que não tivesse! Felizmente levava companhia para nos ajudar. Penoso... custava ter-nos levado a uma enfermaria? A um lugar mais aprazível do que aquele?
Trabalhar ali não deve ser fácil. Num serviço rejeitado e com rejeitados pela sociedade. É o que vi. Se há bons e maus profissionais, claro! Como em todo o lado. Não me esqueço, no entanto, de uma situação em específico numa das minha deslocações para a visita. Não esqueço da cara da besta, desculpem o termo, mas não tenho outro melhor e que descreva tão bem a energúmena, que ao me abrir a porta do serviço sempre fechado à chave, se apercebe que o meu pai está atrás dela, e ela não sabia que aquele era o significado da minha presença, se vira para ele com ar agressivo e diz "Chegue para lá quero abrir a porta!" depois olha para as suas calças pingadas de sopa, que faz notar a sua falta de destreza, e diz com ar arrogante "Olhe para aí todo sujo e pingado! Que vergonha!". Não vou dizer o que me apeteceu fazer àquela não-pessoa, que fez meu pai olhar com ar confuso para as calças e ansioso para mim. O que fiz foi entrar, passando pela cavalgadura, segurar o meu pai e levá-lo até à entrada da casa de banho de onde tirei um papel e lhe limpei as calças. Podem imaginar o ar com que a peça ficou ao ver que era por "aquele" a razão que eu estava ali.
Ele detestava estar ali e eu detestava que ele ali estivesse. Dizia que o tratavam mal, mas não conseguia explicar as situações.
Espero não voltar a precisar daquele serviço mas sei que poderei vir a precisar... O que fazer? Escrever? Falar? Não sei. As minhas energias não dão para todas as lutas.
Neste momento tenho que lidar com o meu pai institucionalizado, e que não sabe que é ali que vai ficar... Que pensa que um dia irá voltar à sua casa que fez com as suas mãos. Como lhe explicar o que ele não entende? Como lhe dizer que ali é onde ele está melhor? Ali tem a vigilância que precisa, os cuidados que necessita e até o carinho que lhe faz bem. Até agora nisso parece que tivemos sorte... Alguma há que tentarchegar até ele.
Imagem retirada da net, obrigada a quem a disponibilizou
Não me recordo se alguma vez estive tanto tempo sem escrever por estes lados. Certo é que a minha cabeça tem andado completamente vazia de ideias, ou cheia de demasiadas coisas, algo que ainda não consegui parar para conseguir decidir....
E, ao contrário de muitos, tempo ainda é uma coisa que eu não consigo fazer. Gostava muito de saber onde é que o iluminado da célebre frase "Estou a fazer tempo" foi buscar a ideia de que o tempo se faz.
De longe é a minha ideia de fazer deste blogue um diário, ou algo que sirva como muro de lamentações, mas, há sempre uma excepção. E sendo este blogue pertencente à minha humilde pessoa, alturas há em que não consigo separar as águas, e esta é uma dessas alturas. Sosseguem almas, não me vou lamentar, digamos que irei antes ranger os dentes, ladrar, e quem sabe também irei ou não morder.
Tal como já disse por aqui os meus dois progenitores tiveram que ser hospitalizados dia 25 de dezembro, tive pois um Natal no ambiente demasiado aquecido e extremamente frio de um Hospital em Trás-os-Montes, penso no entanto que para experiência que irei relatar a localização pouco importará, mas gosto de situar os meus incautos leitores no espaço.
Pois bem, são tantas as coisas que me estão no gasganete que achei por bem, e para vosso descanso, e eu preocupo-me com o vosso descanso, dividir esta minha narração em duas partes, já que também se trata de dois progenitores. Comecemos então pela parte materna.
Após uma queda num corredor de casa a minha mãe teve uma fratura subtrocantérica e mais um palavrão dito demasiado baixo e que não consegui perceber ao ortopedista. Além disso, tinha a cabeça para os dois lados, literalmente. O certo é que necessitava de uma cirurgia com respectivo internamento necessário, iria ficar dependente pelo menos durante 2-3 meses, na melhor das hipóteses, mas depois de estar com ambos os pais no Hospital a melhor das hipóteses era algo que não estava, e ainda não estou, a considerar. E naqueles primeiros dias que se seguiram a esta novidade tive que vislumbrar alternativas que visassem quer uma boa recuperação, quer o apoio, que me iria ser difícil, para não dizer quase Hercúleo, que a minha mãe necessitaria. A solução encontrada, e após o diálogo com profissionais de saúde, seria o encaminhamento para uma Unidade de Cuidados Continuados de Convalescença por 30 dias (que é o tempo das Unidades de Convalescença). Isso implicaria que ficasse mais uns dias hospitalizada até ter vaga numa referida Unidade da nossa área Geográfica. Seja como for isso permitiu que ficássemos, de certa forma, descansados. No Hospital teria apoio para as suas necessidades diárias e iniciaria a recuperação fisiátrica. Era não era? Pois é...
Sempre que a minha progenitora pedia algo era notória a má vontade com que a maior parte das pessoas a brindava na ajuda. Poucas se safavam com um sorriso e solicitude. Nunca foi levada à casa de banho para um banho completo, apesar de ter comentado que precisava- MESMO - de lavar a cabeça, era-lhe colocada uma bacia em cima da mesa davam uma esponjinha e fazia o seu banho parcial na cama que depois seria mudada ao fazerem o levante. No início de um turno da noite uma auxiliar chegou ao cúmulo, e depois de a ter ajudado a sair da cama para se deslocar ao WC, de lhe dizer "Vou mas é colocar-lhe fralda senão não tarda nada está a chamar-me outra vez! Você está sempre a fazer chichi!" e se melhor o disse mais depressa o fez! Colocou uma fralda que ficou toda encharcada e a deixou cheia de urina. Molhando cama, camisa de dormir e a dignidade. Mais tarde, e já na Unidade, veio a ser confirmada uma infecção urinária, daí a sua vontade em urinar. A falta de pessoal quer de enfermagem, quer auxiliar, era evitente mas o custe o que custar é mesmo isto. Bem, a falta de pessoal e a falta de profissiolismo de alguns... Muitos se esquecem do significado da palavra "cuidar".
Um dos médicos da equipa referiu-me que a fisioterapia nestes casos teria que ser feita com muito cuidado já que aquela articulação estava traumatizada e como tal estavam com receio da sua ida para a Unidade, perguntei se a fisioterapia ali, naquele Hospital, teria esses cuidados por ele preferidos, resposta, "Oh, claro que sim! Nós aqui conseguimos controlar isso!". Mais uma vez, pois... ao que parece o fisioterapeuta tinha a sensibilidade de um elefante numa loja de cristais. E fazia exatamente o que o ortopedista tinha dito para não se fazer. Numa das minhas visitas, que dado a distância e o trabalho, não eram tão regulares quanto a vontade, falei com uma médica da equipa e questionando sobre este facto e a ideia com que fiquei foi que a minha mãe estava a mais naquele serviço, a vontade em ajudar não era muita e a ideia era enviá-la para casa pois se ela andasse estava tudo bem. Segue-se que ela tinha, e tem, dificuldade na marcha e eu tinha entendido inicialmente a sua recuperação seria melhor com o apoio da Unidade e fisioterapia adequada. As coisas azedaram de tal forma na minha conversa com uma das médicas que se introduziu à conversa que por pouco não a mandei abaixo de Braga, como se costuma dizer por aqui, não sei o que existirá abaixo de Braga mas espero que seja algo bem nojento. A arrogância da Sr.ª Drª, como frisou que queria que eu lhe dissesse depois de numa frase eu ter dito "Mas ó minha senhora" e ser interrompida como um "Minha senhora não. Senhora Doutora!"!!! Passada que eu estava da mona respondi categórica "Ai sim! Então faça o favor de me tratar por ......" e referi o meu título académico! Fiquei a saber que dizer minha senhora é uma ofensa grave.
Felizmente a vaga para a Unidade foi disponibilizada nesse mesmo dia. E nestes 4 dias pode dizer-se que a recuperação e os cuidados prestados naquela Unidade têm sido excelentes. O cuidado e dedicação de todos os profissionais é evidente e estão ali para atingir objectivos, e o objectivo é o bem estar e a máxima independência do utente.
Tenho descoberto pessoas, digamos, asquerosas, mas também extraordinárias. Muitas me têm ajudado, dado aquela força que tenho que desencantar naquele cantinho que às vezes parece perdido. Muitas são as pessoas que se disponibilizam para ajudar e que ajudam mesmo. E é para essas que vai o meu carinho, a minha consideração e é para essa que vai o meu apontamento. São essas que ficarão. E é por essas que vale a pena tentar remar mesmo com correntes mais fortes.
Estes dois últimos dias foram passados a prepara-me para um procedimento médico e realizar o procedimento em si. Algo que envolvia uma anestesia e para o qual eu não estava nada ansiosa, já que sabia que não ia sentir pitiriba da coisa.
À hora marcada lá estava. Preparada e com uma monumental dor de cabeça! Tantos dias para me doer a cabeça e tinha que ser logo naquele dia... Não tive que esperar muito para ser chamada, não antes sem poder apreciar condignamente a sala de espera que ficará para um próximo post. Idas ao hospital são um manancial para qualquer bloguer. Não tardará nada descobrem este filão de ouro e os hospitais ficarão com mais filas de espera do que já estão.
Lá entrei para a salinha indicada, desapossei-me de todas as minhas vestes e esperei pacientemente o próximo procedimento enquanto respondia à simpática conversa da querida enfermeira que atenuava qualquer desconforto causado pela minha insistente dor de cabeça. Quando chegou a altura de me colocarem a soro avisei, tal como uma boa paciente, que as minhas veias não gostavam de fazer a vontade a agulhas insistentes e ameaçavam sempre fazer as malas. E aí começou a saga...
- Pois. Está ansiosa. (como se falasse de uma verdade irrefutável!)
-Não estou ansiosa. É assim sempre. Quer venha ao hospital, quer tente tirar uma gota de sangue para um tubo. Simplesmente as veias não gostam de agulhas! Eu não tenho problema algum com elas. Mas que posso fazer se as minhas veias não são intrépidas como a pessoa que as alberga?
Depois de uma picadela sem sucesso, seguidas de mais quatro e ainda de três enfermeiras à minha volta me terem explicado que não encontravam o foco sagrado por eu estar ansiosa. Coisa que eu insistia em não estar, mas que estavam a conseguir pôr-me. Aliás, as enfermeiras pareciam mais ansiosas em encontrarem-me as veias do que eu em as disponibilizar. Lá conseguiram a hercúlea tarefa de me colocarem aquele frasco de líquido transparente. E a cabeça continuava a doer... agora um bocado mais.
Lá respondi ao questionário da praxe que queria saber se eu fumo, se me drogo (com estas veias nem que eu quisesse!), se tenho alergias e etc. Dizem-me para me tranquilizar que não irá demorar nada...
Irra! EU ESTOU TRANQUILA! Só me dói a cabeça... dava jeito era uma droguinha para isso...
Aparece de seguida uma médica com pronúncia espanhola, o que me indica que a sua origem é ali ao lado, no país vizinho.
-Hola! Como estách?
- Estou bem, só me dói um pouco a cabeça.
- Claro! És certo que estás anziossa.
(Ughhh!!!)
- Não estou ansiosa mas com tanta gente a achar que estou, se calhar até estou! Sem querer ou sem sequer notar!
Mas se quiserem eu fico ansiosa. Fico ansiosa para que me dêem algo para a dor de cabeça. Por favor
O tempo lá passou e começaram a perceber que de facto eu estava MESMO era com dor de cabeça e o bendito remédio não se fez esperar. Já agora aproveita-se o vaso sanguíneo que deu tanto trabalho a descobrir.
Esta mania de catalogar tudo de "é ansiedade", e que temos obrigatoriamente que estar ansiosos é simplesmente irritante. É absolutamente normal qualquer ansiedade e até desejável, mas será que é mesmo necessário tentarcolocar-se os pacientes ansiosos com a ansiedade que não sentem? Pelo menos aquela ansiedade que queriam a viva força que eu tivesse e que não tinha.
Imagem retirada da net, obrigada a quem a disponibilizou
As crianças adoram comparar brinquedos, jogos, vestuário... enfim montes de coisas e coisinhas!
Quem já não assistiu a uma célebre discussão infantil, deste género:
- A minha boneca diz mãmã mais alto que a tua!
- E não!!
ou então,
- Eu corro mais depressa que tu! Nha, nha, nhaaa
- E não!!!
Na fase adulta também se passa por essa fase, mas sem a parte de deitar a língua de fora e de cantar o "nha,nha, nhaaa"! Bem, pelo menos não se nota que o fazemos. Porque fazemos, mas para os nossos botões. É mais do género:
- Olha! Já viste o meu casaco? Ora toca! É fofinho não é? - baixinho, e para ela, poder-se-ia ouvir ,"nha, nha, nhaa, é mais quente e mais fofinho que o teu!"
ou então,
- Anda cá pá! Já viste o meu portátil? Já viste a quantidade de terabytes que tem? E topa-me esta velocidade! Hã? - neste caso, poder-se-ia ouvir "lixaste-te!!! Nha, nha, nhaaa (ou então linguagem imprópria substituída por, Fpiiii!)
Na minha "rodagem" pelas salas de espera do Hospital escuto diálogos deveras interessantes e que não deixem de me surpreender,
- Não consigo mexer a perna! Não tenho força nenhuma...
- Oh! Minha senhora então e eu? que acordo carcomidinha de dores? Não durmo nadinha!
- Dormir? Eu já não sei o que é dormir descansada há muito tempo! Doi-me o corpo todo!
Como estão empatatas, tentam desempatar da seguinte forma:
- E os medicamentoa que eu tomo? Olhe, ele é para a tensão, para os diabretes (para os menos habituados a estas linguagens, diabretes significa diabetes), ele é para as dores, enfim às vezes penso que vou entupir de tanta coisinha que engulo!
- Nem me fale! Eu não tomo para os diabretes, ou lá o que é... mas tomo para as minhas alergias! Espirro com tudo! Ainda no outro dia o meu me disse, "Ó mulher parece que vais rebentar as vias de tanto espirrar!" . Pronto, lá tenho que ir arejar um bocado a ver se passa.
- Ehhh....
- Ehhh...
Assentem num curto silêncio e viram-se para a discreta observadora, que entretanto foi notada! Então, para ver se desempatam a querela, chutam:
- E a menina? O que tem? Tão nova!
Se existissem balões de pensamento, tipo os de banda desenhada, estaria escrito: - Chiiii! Ardeu!